sexta-feira, 20 de junho de 2003

Conquista do Dedo do Moleque


Relato – Expedição da Conquista do Dedo do Moleque


Por: Andrea Zimmermann

18/06/2003 – quarta-feira

Finalmente chegara o dia de nossa expedição.  Após várias reuniões para definirmos nossa estratégia para aproximação da base e conquista do Dedo do Moleque, decidimos ir de carro,  na Mitsubish Pajero do Nuno, pois conseguiríamos acomodar os sete participantes.  Como bons brasileiros, saímos atrasados duas horas.  O planejado era de partirmos  às 18h do posto Colorado mas,  o importante é que vencemos o primeiro medo: “ o de não partir”.  Todos nós estávamos eufóricos com a expedição que começou como um sonho com duração de  um ano e agora estávamos próximos a realizá-lo.  Dos participantes (Nuno, Allan, Davi, Camila, Marcelo, Fabio e eu), somente eu e o Fábio já tínhamos visto o Dedo do Moleque. Para os outros,  a imagem ainda era a silhueta de uma foto tirada do rio Paranã ou do pôr do sol da Pedra Branca. 


Com o atraso na partida e o fato de não ter diesel em Teresina de Goiás para abastecer o carro,  seguimos para Cavalcante e dormimos num camping porque o posto só abriria na manhã seguinte.
A noite estava maravilhosa e dormimos com o brilho e a energia vibrante das estrelas.

19/06/2003 – quinta-feira

Acordamos 6h15 mais ou menos,  nos arrumados,  abastecemos o carro no posto de Cavalcante que abria às 7h e partimos para enfrentar os 124km de estrada de terra que nos levava ao Vão do Moleque.
Ao contrário do que pensávamos, a estrada estava boa mas realmente o carro 4x4 foi necessário para atravessar os rios Curriola e Prata.  O caminho já nos entusiasmou por sua beleza e formações de quartzito que apareciam ora ou outra nas bordas da chapada além dos vales fantásticos do lugar.  O acesso à Capela no Vão do Moleque se dá pela pista principal da estrada. Entretanto,  foi muito útil utilizar o GPS e os dados das rotas do Centro Excursionista do Planalto Central  para evitar de pegar o caminho errado em alguma bifurcação.
Chegamos à Capela às 11h30 da manhã  onde havíamos combinado de encontrar o Francilino, um calunga amigo do Nuno que estaria nos esperando com os cavalos. O meio de transporte  da nossa carga até o acampamento base.  Procuramos Francilino por toda parte mas ele fora embora porque ele tinha a expectativa de nos encontrar  na noite anterior e assim achou que tínhamos desistido da aventura.  Bom, perdemos Francilino e em compensação achamos o Martinho.  Gente boa demais!  Martinho é dono da fazenda onde se inicia a trilha para a base do Dedo do Moleque. Enquanto arrumávamos todo material da conquista na deliciosa sombra de um cajueiro,  Martinho conseguiu sete cavalos para levar os equipos,  50 litros de água e que também acabaram carregando o Nuno e o Marcelo  para cima.

Nossas impressões iniciais de que teríamos que varar mato,  que seria uma ralação chegar lá em cima foram deixadas de lado e fizemos uma trilha bem marcada que tangenciava o Morro do Moleque com subidas gradativas que nos levou à face sudoeste da rocha.
Depois de duas horas de caminhada, de muitas fotos e alegria por estarmos nos aproximando de nosso  destino, chegamos ao nosso acampamento base localizado a aproximadamente 400m da base do Dedo do Moleque.  O solo era bem rochoso mas conseguimos um local plano com terra para montar as barracas mas que não tinha água por perto.  Já eram 17h e o sol se aproximava do horizonte com sua luz dourada tornando mais mágica a rocha à nossa frente.  Aproveitando a luz fantástica, eu, Fábio e Marcelo subimos a encosta para ver o pôr do sol e  nos demos conta que realmente estávamos ali muito próximos da conquista.  Mais uma vez a noite estava maravilhosa. Preparamos nossa comida e e dormimos cedo para a escalada do dia seguinte.



20/06/2003 - sexta-feira

Às 7h já estávamos de pé arrumando nossos equipamentos para a escalada.  Nuno e Alan formaram uma dupla,  escolheram uma bela fenda na rocha por onde passariam e se adiantaram saindo na frente do grupo.
Nós decidimos sair os cinco juntos e investirmos na face oeste.   
Os primeiros 20 metros, aproximadamente, são de escalaminhada e trepa pedra mas em alguns momentos consideramos conveniente nos encordarmos  devido às pedras soltas.  Na subida inicial, tivemos as boas vindas de uma cobra coral que recepcionou o David na fenda de um bloco.
Ao atingirmos o primeiro platô,  nos dividimos em uma dupla formada por David e Marcelo e um trio comigo, a Camila e o Fabio.  A dupla seguiu por uma fenda no sentido noroeste da rocha com David guiando e nós partimos para o lado sudoeste seguindo por algo indefinido  entre chaminé e fenda.  Nossa via variou entre escaldas com lances de 5º grau com passagens de 3º grau.  Ora ou outra avistávamos Nuno e Allan na face sul. 
A primeira dupla a chegar ao cume foi Davi e Marcelo. Depois de quatro horas e 150m  de escalada, eles  gritavam pelo talkabout: “Abresca no cume, galera”! 


Seguido a eles, chegaram Nuno e Allan e finalmente Fabio, eu e Camila alcançamos nosso objetivo.   Todos estavam muito emocionados e felizes!  Três viam em móvel foram abertas sem a utilização de pítons.  A vista de cima é fantástica.  360º de paisagens conservadas, vales incríveis e o imponente e saudoso rio Paranã.
Como não levamos um livro de cume,   montamos um toten e deixamos em baixo dele um papel num saquinho “zip” com o registro da conquista (o livro de cume foi levado por nós na expedição de 2006).  Os nomes das vias abertas são: 
4   Abrescanos Tulidenses  - David e Marcelo
4   Trinity -  Fabio, Andrea e Camila (era a terceira vez que a Camila escalava em rocha, que guerreira, hein!)
4   Via do Dedo – Nuno e Allan (o nome se deu não pelo Dedo do Moleque mas porque Nuno esmagou o dedo numa rocha ao colocar um friend. Então, em homenagem...)
Na descida,  Nuno e Allan fizeram rapel pela Via do Dedo e nós cinco rapelamos na corda dupla de 50m pela via  Trinity.  Demoramos aproximadamente duas horas descendo.  Ficamos mais algum tempo na base contemplando o pôr do sol que encerrou com seu calor e sua luz dourada esse dia inesquecível.
À noite, gravamos depoimentos sobre a escalada e nos entretemos contando as histórias do dia. Eu e o Fabio conseguimos contato via satélite por rádio com alguns rádioamadores de Curitiba, Campinas e Rio de Janeiro que acompanhavam de longe nossa expedição. Falamos também com o pessoal do Clube do Jipe que estavam circulando pelo Vão.



21/06/2003 – sábado

Acordamos e decidimos partir. Afinal, a missão já estava cumprida.  Arrumamos nossas mochilas e combinamos de deixar os equipamentos mais pesados para que Martinho os carregasse no cavalo. Nós tínhamos combinado dele nos trazer água e assim o encontraríamos na trilha de volta.  Assim aconteceu.  Seguimos e Martinho pegou nossos equipamentos deixados no local do acampamento.  Chegamos no carro aproximadamente 11 horas.  Ficamos largados um tempo e depois saímos para tomar um banho de rio enquanto dona Santina (a esposa do Martinho) preparava um delicioso almoço para a turma.  Depois de comermos, seguimos viagem planejando pernoitar  às margens do rio Prata.  Chegando lá,  decidimos continuar viagem até Cavalcante.  Depois de várias idéias e sugestões dos diferentes membros do grupo,  seguimos para o Macaco.  Não podia ter sido melhor! No caminho, paramos em Alto Paraíso para comer pizza feita no forno a lenha (huummm...).  Tudo de bom! Chegamos mais ou menos 23 horas no Macaco, nos acomodamos numa oca e dormimos muito bem.

 
22/06/2003 – domingo

Aproveitamos o último dia da expedição nas cachoeiras do Macaco.  O lugar é maravilhoso, há cinco cachoeiras lindas e várias paredões de quartzito escaláveis. Fizemos duas vias mas  infelizmente não sei o nome uma delas. Uma está grampeada e é um 6º grau e a outra é um 5º que escalamos em top rope.  Esse dia foi só relax  e curtição.  Cada momento desta viagem foi especial. As pessoas,  os lugares e eu não podia terminar esse relato sem falar da música.  Ouvimos sons africanos e world music – mantras que nos acompanharam até a chegada em Brasília.
Voltamos já pensando na próxima investida no Dedo do Moleque chegando pelo rio Paranã de “duck” (botes infláveis),  montando cavalos e conquistar a face leste do Dedo ainda desconhecida. Sonhos, sonhos, sonhos....




Nenhum comentário:

Postar um comentário